segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Mover-se em linha recta num universo curvo


Fresco na rocha,Tassili, Argélia 7,500 A.C.

Durante os nossos anos da Serra de Ossa quizemos curvar a nova vida. Sermos bichos de acordo com a natureza, lembro-me dos meus pesadelos de infância de estar debaixo da terra rodeado de animais repugnantes e como eles se foram convertendo em paz e húmus. Saber que a morte faz parte da vida é diferente de o sentir em cada dia e em cada estação do ano. No olhar do primeiro borrego que matei com a navalha recém afiada dissolvendo-se numa cavidade atrás da orelha. Na morte de todo o galinheiro feita por "saca-rabos" que deixaram todos os cadáveres intactos com excepção das marcas das garras no dorso das aves e o lugar nos pescoços onde lhes sugaram todo o sangue. Do fogo que destrui práticamente toda a floresta e o despontar dos primeiros rebentos nos jovens e negros sobreiros que cuidávamos mortos.

No estado de animalidade e de ausência de mundo em que viviamos aprendemos o refúgio nos territórios do espirito. A convivência com a morte e com a vida, sugeria-nos a contemplação da eternidade e o sítio onde viviamos inspirava-nos como tinha inspirado muitas gerações de monges que antes de nós tinham habitado aquela casa e tinham amanhado, muitas vezes ajardinado, aquelas terras. Hoje estamos na acção.

Para disparar uma seta é necessário dobrar o arco.

Foi esta ideia e evidentemente o texto da Arendt que cito como sub-titulo, que me inspirou para criar este espaço para que pudessemos pensar a relação entre acção e contemplação. Entre a seta e o arco.

Entre a seta e o arco está a corda. A vida estará na tensão da corda?